Família Sayeg, Traços de uma vida e de uma cidade – São Paulo.

Fotos do Álbum da Família Abdelmalack
Organização de Genny Abdelmalack
Leão Sayeg veio de uma das cidades mais antigas do mundo, Alepo, na Síria. Desembarcou no Brasil em 1912. Trouxe no nome o ofício dos seus antepassados. O Sayeg faz referência à tradição profissional de ourives.
O convívio com os patrícios foi natural. A colônia sírio-libanesa se fixou na região que ficava ao norte do bairro da Sé e ao sul da Santa Ifigênia, no triângulo formado entre as ruas 25 de Março, da Cantareira e a Avenida do Estado. Conheceu Genny, jovem síria que havia chegado ao Brasil alguns anos antes dele, em 1906. No ano de 1924, conquistou a jovem Genny Abdo Jorge, que completou 18 anos no dia 9 de setembro e se casou com ele no dia 30 de novembro do mesmo ano. O casal seria o alicerce para uma família que se envaidece da tradição joalheira, hoje, reconhecido na mais que centenária Casa Leão.
Sayeg atuou como ourives e comerciante de joias. Assim que se instalou em São Paulo, em 1918, abriu sua primeira oficina, na Rua Florêncio de Abreu, 90. Tratava-se de uma das ruas vinculadas ao início da urbanização da cidade, ao lado da Líbero Badaró. Mais tarde, em 1942, vai para a Rua Dr. Miguel Couto, no. 14, travessa da Rua São Bento, centro econômico e financeiro da cidade, próximo ao Largo do Café, no coração de São Paulo.
Formado na prática, Leão Sayeg deixou um legado de competência que permanece na base de seu empreendimento, agora sob o comando da terceira geração, nas mãos de sua neta, Lydia Leão Sayeg.
A Revolta de 1924, deflagrada no dia 5 de julho, teve a Rua Florêncio de Abreu como palco de violentos confrontos entre as tropas oficiais e dos revoltosos, pois foi lá que se levantaram as trincheiras que bloquearam a passagem das tropas que avançavam pela cidade, vindas do quartel da Avenida Tiradentes, em direção ao Centro. A loja não escapou dos ataques dos tanques das forças do Exército aliado ao Governo Central. Bombardeada, teve a fachada destruída e foi saqueada. Nesse momento difícil aliado à depressão econômica do início dos anos 30, Leão Sayeg se reestabelece como profissional autônomo, trabalhou em casa, atendeu seus clientes em particular e fazia visitas, semelhante a um mascate.
A residência do casal na Rua Frei Caneca, na primeira quadra da Avenida Paulista, era organizada por Genny, que ficava em casa e era uma ótima anfitriã. Leão tinha por hábito encher a casa de amigos e promover confraternizações. Entre 1925 e 1932, o casal teve cinco filhos: Jorge, Georgette, Leonor, Ivete e Ivan, caçula e, pai da Lydia. As férias da família se revezavam entre os balneários. No balneário Águas de Lindóia, famoso por suas águas termais de efeitos terapêuticos e Santos, a família tinha uma casa de veraneio.
Em 30 de novembro de 1949, Leão e Genny celebraram suas Bodas de Prata. O casarão da Rua Frei Caneca, como sempre, ficou cheio. Lá o casal recebeu os parentes e os amigos, para alegria de todos. Entretanto, no dia 30 de maio de 1950 veio o baque, a tristeza, Leão faleceu, inesperadamente, aos 57 anos. A viúva abriu mão da sua parte no negócio e os filhos assumiram a joalheria. Iniciava uma nova fase da história da Casa Leão, que continua ainda hoje nos Jardins[1].
Interpretação da Foto Revelada da Família Sayeg por Genny Abdelmalack, colaboradora do Museu
A foto do casamento apresenta a noiva com um vestido de tafetá seda bordado com fios de ouro, moderno para os padrões daqueles tempos, pois era sem mangas, confeccionado de forma a aproveitar da melhor maneira possível o tecido. Vestido tubular, tecido plano simples[2], corte reto e solto, seguindo o urdume. O luxo veio depois, com os bordados feitos com pérolas e brilhantes, que cintilavam nas mangas e em todo véu, em volta da cabeça, tornando o traje incomum e especial.
A moda, na década de 1920, estava livre dos espartilhos e a silhueta se torna tubular. Na maquiagem, a tendência era o batom. A boca era carmim, em forma de coração. A maquiagem era forte nos olhos, as sobrancelhas, muitas vezes, eram tiradas e o risco pintado a lápis. A beleza da pele era ser bem branca.
O véu[3] era feito em tule (filó) de seda, no caso francês, ou de algodão, as principais matérias primas utilizadas na confecção dos véus. A grinalda faz com que a noiva se pareça com uma rainha, distinguindo-a dos convidados. Quanto maior a grinalda, maior era o símbolo de status e riqueza. A grinalda de Genny faz referência a uma coroa bizantina que como o chapéu, modelo cloche, era enterrada até os olhos, usada com os cabelos curtíssimos, a la garçonne, comum à época. As mãos cobertas pelo cetim das luvas brancas que seguravam o buquê delicadamente envolvido pelo, também, cetim de seda branco com acabamento em laço.
Inicialmente, o fraque foi usado pelos cavalheiros ingleses do século XIX como uma roupa elegante para montar a cavalo durante o dia, subiu de status e tornou-se um traje masculino usado para atender ao traje de cerimônia. Entretanto, a primeira peça de roupa a escurecer não foi a casaca e sim o smoking, as pessoas elegantes começaram a usar preto a noite, e ainda hoje continuam; preto relaciona-se com distinção.
O smoking normalmente é composto de: laço preto de seda ou gravata borboleta, camisa branca podendo ter a frente trabalhada, faixa de cetim (na cintura) ou colete, paletó preto com lapela acetinada, calças pretas às vezes com laterais no mesmo material da lapela, meias pretas e sapato clássico preto. Em ocasiões especiais, como no caso do casamento, Leão usou paletó, colete e calça de lã fina pretos (smoking), camisa de colarinho elevado quebrado e gravata borboleta acompanhada de luvas e lenço no bolso do paletó igualmente brancos (fraque) e na lapela um broche de brilhantes.
Outro elemento para compor a análise da fotografia de época é que no início do século passado era comum que momentos importantes fossem eternizados pela fotografia e, posteriormente pela pintura[4]… Fazendo o registro que hoje trazem as lembranças do passado para um lugar no presente de cada um que olhar estas imagens. Assim temos a fotografia do casal Sayeg em trajes de cerimônia e a pintura, ambas eternizando o momento.
Referências Imagens São Paulo:
- Grupo1
*Foto¹ Vista Largo da Sé, confluência das ruas 15 de Novembro e Direita (1912?) Guilherme Gaensly. Disponível em < http://spantiga.folha.com.br/foto_11.html > acesso em 20/11/2014.
*Foto² Ladeira de Santa Ifigênia em 1927. Col. Aurélio Becherini. Disponível em< http://topicos.estadao.com.br/fotos-sobre-aurelio > acesso em 20/11/2014.
*Foto³ Rua 25 de Março e Várzea do Carmo, no trecho conhecido como Várzea de Santa Rosa. 1914. Disponível em < http://www.band.com.br/noticias/galeria/?id=1000003653 > acesso em 20/11/2014.
- Grupo2
*Foto⁴ R. Florêncio de Abreu 1914. Disponível em < http://imperatrizleopoldinahabsburgo.blogspot.com.br/2008/10/so-paulo-antigo.html > acesso em 23/11/2014.
*Foto⁵ R. Dr.Miguel Couto, anos 50. Disponível em < http://almanaque.folha.uol.com.br/doutor_miguel.htm> acesso em 23/11/2014.
*Foto⁶ Rua São Bento, 1911. Disponível em < http://www.lojadoposter.com.br/pd-d3774-poster-sao-paulo-antiga-rua-sao-bento-1911.html?ct=699d8&p=1&s=1> acesso em 23/11/2014.
- Grupo3
*Foto⁷ “Aspectos do saque que, infelizmente, campeou em São Paulo”. Revista da Semana, Número extraordinário, ago.1924, p.10. Acervo AHMWL/SMC. Disponível em < http://netleland.net/hsampa/epopeia1924/Epopeia1924.html > acesso em 23/11/2014
.*Foto⁸ Combate centro da cidade durante a rev. de 1924. Disponível em < http://netleland.net/hsampa/epopeia1924/Epopeia1924.html > acesso em 23/11/2014.
*Foto⁹ Pessoas em fuga pelo centro da cidade a rev. de 1924. Disponível em < http://saudadesampa.nafoto.net/photo20060719181821.html> acesso em 23/11/2014.
- Grupo4
Foto¹° Trianon com vista para Av. Paulista 1916. Disponível em < http://theurbanearth.wordpress.com/category/imagem-de-cidade/page/3/> acesso em 24/11/2014.
Foto¹¹ Cartão Postal da Avenida Paulista em 1905. Disponível em < http://smdu.prefeitura.sp.gov.br/historico_demografico/img/1900/av-paulista-1905_grande.jpg> acesso em 24/11/2014.
Referências Bibliográficas:
FERNANDES, Paula Porta S. (coord.) Guia dos Documentos Históricos na Cidade de São Paulo 1554-1954. NEPS, São Paulo: Hucitec, 1998.
HARVEY, John. Homens de preto. São Paulo: Unesp, 2001.
HAYE, Amy, de LaMendes,Valerie. A Moda do Século XX. São Paulo: Wmf Martins Fontes, 2009.
LAVER, James. A roupa e a moda: uma história concisa. São Paulo: Companhia das Letras, 1996.
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Notas:
*¹ Para conhecer mais dessa história, acesse: http://symphonicnews.wordpress.com/2013/12/23/lydia-leao-sayeg-um-diamante-lapidado-com-carinho-capa-da-public-first-class-ed-22/
*² Foto 1-Detalhe vestido, tecido plano simples: resultante do entrelaçamento de dois conjuntos de fios que se cruzam em ângulo reto. Os fios dispostos no sentido horizontal são chamados de fios de “trama” e os fios dispostos no sentido vertical de fios de “urdume”.
Foto 2- Princesa Astrid da Suécia nos anos 20. Disponível em < http://www.noivacomclasse.com/2013/07/grande-gatsby-colecao-vestidos-de-noiva.html > acesso em 30/11/2014
Foto 3- Tafetá de seda Disponível em <http://www.gjtecidos.com.br > acesso em 28/11/2014
Foto 4- Casamento real na Inglaterra em 1922 de Edwina Ashley e com o lorde Louis Mountbatten, bisneto da rainha Vitória. O vestido da noiva era prateado, todo bordado de cristais e diamantes, feito pela casa Reville-Terry. Disponível em < http://amandicaindica.blogspot.com.br/2011/06/noiva-do-dia-edwina-ashley.html> acesso em 30/11/2014
*³ Hijab(véu)quer dizer, em árabe, “o que separa duas coisas”. O véu da noiva significa separar-se da vida de solteira para entrar em uma nova vida entre outros significados como sendo uma referência à deusa Vesta (da honestidade), que, na mitologia greco-romana, era a protetora do lar. Disponível em < http://www.casadinhos.com.br/significado-do-casamento.html> acesso em 30/11/2014 Fotos-Disponíveis em <http://www.gjtecidos.com.br > acesso em 28/11/2014
*⁴Pintura do retrato de casamento. Disponível em< http://casaleao.com.br/casaleao/images/midias/Revista%20Holla.pdf >acesso em 03/12/2014
Genny
Adorei! Parabéns por tudo: escolhas das fotos, desenvolvimento dos comentários e análise de época.
Beijo
Anna Rahme
Anna,
grata por sua colaboração.
Equipe MIMo
Genny, parabéns pelo lindo trabalho, me emocionei muito!
Chris,
agradecemos seus comentários. Continue acessando nosso museu.
Equipe MIMo